Antígona no Service Desk

O mito de Antí­gona vive, 2.500 anos depois, em nossos ambientes de suporte técnico

Toda vez que você questiona algo usando argumentos racionais, está — de certa forma — filosofando.

E o interessante é que se estudar um pouco sobre filosofia, as suas chances de resolver os problemas do cotidiano serão maiores. Um exemplo é o mito de Antí­gona, tradicional embate de ideias sobre o que é certo ou errado.

Introdução à Antí­gona

Esse mito foi apresentado na peça trágica de Sófocles há quase 2.500 anos atrás. Ou seja, há muito tempo mesmo.

Nela, Édipo morre (aquele do Complexo de Édipo) e deixa vazio o trono da cidade de Tebas. Seu cunhado Creonte toma o poder, em detrimento dos quatro descendentes de Édipo.

Um deles, Polinice (parece mais nome de mulher), fica indignado e marcha contra Tebas para retomar seus direitos hereditários. Fracassa a iniciativa do rapaz, pois ele morre na luta.

Apoiado pela lei do Estado, Creonte ordena que ninguém enterre Polinice, pois o mesmo lutara contra a própria Tebas. Antí­gona, irmã de Polinice, protesta contra tal decisão, pois pelas leis dos deuses todos merecem um enterro.

O desenrolar da história você encontra nos livros e até na internet.

O importante da história é que se deflagra um questionamento que persiste até hoje.

Quem tem razão? As leis dos homens ou de sangue? Da sociedade ou da natureza? Da religião ou do estado? Quem está certo e quem está errado? Se um sujeito não tem dinheiro para comprar os remédios de sua esposa, ele pode assaltar uma farmácia, ainda que prejudique o dono da mesma?

Dizem que a ordem deve assegurar as liberdades. E que as liberdades devem respeitar a ordem. Não é um equilí­brio fácil de administrar.

E no Service Desk?

Claro, ambientes primitivos não sofrem com o conflito do mito de Antí­gona.

É preciso existir uma lei do Estado.

Assim como os centros de suporte que, desorganizados, vivem à revelia dessa discussão.

Como não existe civilidade e um conjunto de regras, vale tudo.

Mas se o departamento de suporte já definiu processos, estipulou acordos de SLA’s para os serviços, administra e controla a carga dos técnicos, impõe limites à ânsia dos usuários… A situação começa a mudar e existe a chance de se manifestarem antagonismos baseados nesse mito.

Por quê? Por que é um ambiente propí­cio ao dilema de Antí­gona, pois nele está presente a ordem. Existe lei (do Estado). Impõem-se métodos e fluxos programados das informações. Mas em algumas circunstâncias, algo que parece ser o mais certo a fazer no momento vai contra as definições estabelecidas.

Exemplo 1

Um usuário deseja falar diretamente com alguém do segundo ní­vel de atendimento.

Pode? Pela ordem planejada (ou também pelo ITIL), nem pensar. Recordo da apresentação no Congresso HDI de 2010, onde Ana Lúcia Martins e Paula Cavanesi compartilharam algumas ideias oriundas de suas experiências. Mostravam que se o primeiro ní­vel não for resolver o problema, ele será apenas burocrático, fazendo o usuário perder tempo. Então por que não buscar direto ao segundo ní­vel?

Exemplo 2

O pessoal do Service Desk deve gerenciar o ciclo de vida do incidente. Quando o incidente é resolvido, alguém deve contatar o usuário para confirmar.

Contudo, e se o volume de trabalho é muito grande tornando impraticável tal modo de agir? E se as caracterí­sticas dos usuários (viajando o tempo inteiro) impedirem tal conduta? Vale a definição do processo ou o que acontece no dia a dia?

Você alegará que os processos foram mal construí­dos… Talvez à revelia da realidade. Porém, todos abemos como ela muda rapidamente e a documentação dos processos (e as reuniões para isso) não é tão ágil assim.

Deixa como está

É difí­cil decidir o que é o certo ou errado. Você pensaria: bom, se isso é realmente difí­cil e quase não tem solução, pra que esquentar a cabeça? Deixo assim e quando o problema surgir eu decido o que fazer.

E eu lhe digo que como profissional (em negrito) da área, é sua obrigação pensar em tais situações, em vez de se omitir e jogar a culpa no destino. Ou no superior (“— Meu chefe vive alterando as prioridades, dando mole aos usuários…”).

Controvérsia

Quer ver algo interessante? Pegue o exemplar da revista SupportWorld (grátis aqui) de junho/julho de 2012. Na página 18 Valtomir Santos, reconhecido profissional da área, recomenda convocar o usuário a utilizar o autosserviço. Isso para obter redução do custo médio de ticket no departamento de suporte.

Na mesma revista, vinte páginas adiante, o papa da governança brasileira de TI, Ricardo Mansur, escreve…

Exatamente o contrário! Que é mais barato fazer o usuário ligar para o centro de suporte do que tentar se virar sozinho através de um autosserviço.

Existe uma variável que muda todo o enfoque nos discursos das personalidades citadas. E faz com que ambos estejam certos. Você consegue identificar qual?

Encerrando o artigo, o que é certo? E o que é errado?

Você cobiça encontrar alguma “lei do estado” — uma metodologia — para seguir sem questionar, refletir, nem indagar sobre? Sempre poderá argumentar que “seguiu o padrão estabelecido”.

Mas isso seria o melhor a fazer para o seu negócio?

Think about.

Abrazon

EL Cohen

1 comentário em “Antígona no Service Desk”

  1. Olá! O que é certo? É o que se adequa melhor no cliente em questão. Percebi que não existe regra imutável, mas sim regra que funciona ou não para cada ambiente. É isso!

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