Como transformar seu Service Desk em um circo (sem precisar de IA)

Sextou.

Dia especial da esculhambação, nova tradição elaborada por mim.

Dia do Esculacho. Ao estilo Paulo Francis, Diário do Geraldo (leia revista Piauí), Millôr Fernandes e Voltaire.

Vou tentar falar algumas verdades brincando.

Ou ao melhor estilo Cohen (ou deles acima): com ironia, nosense e sarcasmo (do grego sarkasmós, que vem de sarkázein, “rasgar a carne”, usado figurativamente para indicar zombaria mordaz).

Assunto: a falta de limites nos centros de suporte técnico em relação às demandas de seus clientes/usuários.

Uma introdução

Fui à academia às oito. Dever cumprido, endorfinas ativadas, voltei pra casa e uma vez que a jefa vai viajar com as filhas, coloquei a roupa na máquina pra adiantar serviço.

Enquanto o tambor girava naquele ciclo de enxágue e centrifugação, pensei: o centro de suporte técnico virou isso daí.

Um tambor girando sem parar, atendendo solicitações que entram por tudo quanto é lado — inclusive as que nunca deveriam ter entrado. PQP.

Quem trabalha pesado no ambiente de atendimento sabe do que se trata. Quem se esquiva dos abacaxis e só apanha cerejas, comportamento usual de quem vai ao parquinho diariamente, passa longe disso.

Situação

Nos centros de suporte, uma realidade incômoda se repete:

Clientes e usuários extrapolam sem pudor os limites do serviço.

  • Pedem instalação de programas não homologados.
  • Querem alteração em sistemas que não fazem parte do contrato.
  • Pedem ajuda pra recuperar um arquivo de 2017 salvo na unidade errada.
  • E aquele gestor da área <não posso dizer> que espera resolver uma urgência inventada agora — por que, claro, tudo que pede é especial. E, como bônus, espera que seja feito ontem.
  • E o clássico: “Sei que não é com vocês, mas conseguem dar uma olhadinha?”.

Nessas horas, entra a IA — que muitos esperam que substituirá o suporte.

Spoiler: a IA já entendeu que tem coisa que nem ela quer fazer, kkk.

Cotidiano

Esses pedidos fora da curva não são exceções pontuais. Viram parte da rotina. Alguém atende, outro imita e a porteira está aberta: e o que era exceção ganha status de política-oficial-não-documentada.

Pior: se o analista diz “não”, se fudeu rola até ameaçazinha passiva-agressiva. Leva fama de burocrático, de desinteressado ou pior, vilão!

“Vou falar com seu gerente, por que o suporte antes era mais colaborativo.”

Essa lógica do “tudo é prioridade” serve apenas para gerar caos. O problema não está só na demanda em si, mas no atropelo do escopo. Ao invés de respeitar processos, clientes e usuários agem como se o suporte fosse uma extensão dos próprios caprichos. E isso esgota o time — técnica e emocionalmente.

A gestão, muitas vezes, assiste a tudo com cara de patê paisagem:

“Vamos atender só esse aqui, pra não dar problema com o cliente.”

A IA diria: isso se chama “Reforço de Comportamento”.

A cultura organizacional piora a situação

A cultura organizacional de algumas/muitas empresas insiste em recompensar o improviso, mesmo quando custa caro. E o suporte técnico passa a operar na gambiarra — cenário perfeito para erros, retrabalho, desgaste, stress, ausências (a lista é longa, mais do que os aposentados esperando a devolução dos descontos no INSS).

Esse comportamento destrói a previsibilidade operacional.

Como planejar ou priorizar quando qualquer um aparece com uma bomba-relógio disfarçada de “urgente”?

  1. A equipe não consegue se organizar.
  2. O backlog vira um repositório de frustração.
  3. E a qualidade do serviço cai — não por incompetência, mas por saturação.

Vamos se organizar!!!

Catálogo de Serviços. O que é que a gente faz. E principalmente, não faz. E os prazos para cada tarefa.

Impor limites não é dizer “não” por prazer.

Limites não são muralhas. São sinalizações. É dizer “sim” para o que realmente importa.

É manter a qualidade do atendimento e proteger a saúde mental do time.

É definir o que é viável, o que é prioridade, o que será feito — e o que não será. É garantir que o serviço tenha consistência.

E se alguém vier com aquela frase profética: “a IA vai substituir os técnicos”, eu devolvo com outra: a IA já aprendeu a dizer “isso está fora do escopo”.

Só falta o humano ter a mesma coragem.

Aí, gestor…

A gestão precisa assumir esse papel. Definir escopo, comunicar diretrizes, treinar os usuários, revisar SLAs. Sem tais fundamentos, qualquer tentativa de organizar o caos será só mais um post-it no quadro — ignorado como tantos outros.

No fim, manter limites é um ato de cuidado. Com o serviço, com a equipe e com a reputação do próprio suporte. Por que quando tudo é permitido, o que é essencial perde valor. E aí, ninguém mais consegue entregar bem — nem com boa vontade, nem com reza.

Limites existem para proteger a qualidade — do serviço e das pessoas. Se tudo é aceito, nada tem valor. E num suporte sem fronteiras, o que se perde não é só tempo. É o sentido do trabalho.

E papais e mamães: vale o mesmo pros filhos 😉

Sextou

Feito. Sexta-feira.

Vou levar minha mãe de 86 anos, de surpresa, à sorveteria da infância dela, onde cada colherada é um retorno aos tempos de criança dela.

Assim espero, kkkk.

EL CO

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